domingo, 31 de maio de 2009

INSANIDADE MENTAL DO ACUSADO*

Por fim, o derradeiro processo incidente cuida da possibilidade de constatação, tanto na fase investigatória quanto no curso da ação penal, de eventual moléstia mental do acusado ou indiciado, a ser resolvida em procedimento apartado, para não prejudicar o andamento da persecução penal.

O incidente somente será instaurado diante de dúvida séria e fundada sobre as condições mentais do acusado, podendo fazê-lo o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor ou curador do acusado, bem como de seu ascendente, descendente, irmão ou cônjuge (art. 149).

Na fase de inquérito, o requerimento poderá ser feito pela autoridade policial.

Entendemos que o rol de legitimados anteriormente mencionado não é (nem por ser) taxativo, diante do evidente e eminente interesse público na apuração de tal questão.

Por isso, parece-nos perfeitamente possível que qualquer pessoa interessada, sobretudo aquelas sob cujos cuidados ou guarda (ainda que informal) esteja o acusado (ou indiciado), será autorizada a provocar a instauração do incidente de insanidade mental.

Das conclusões do laudo médico-legal, a ser realizado no prazo de 45 dias, prorrogáveis quando necessário, duas soluções poderá ser adotadas, a saber:

a) constatado que o acusado (ou indiciado) já era inimputável (art. 26, CP), ao tempo da infração, o processo terá seu curso normal, nomeando-se-lhe curador;

b) se comprovado, porém, que o acometimento da doença é posterior à infração penal, se já em curso ação penal, o processo continuará suspenso (suspensão anteriormente decretada com base no art. 149, § 2° do CPP), até o restabelecimento do acusado, sem prejuízo da realização dos atos reputados urgentes (art. 152).

Explica-se: na primeira hipótese, o provimento final da ação penal será a imposição de medida de segurança (arts. 96 e seguintes do CP), por se tratar de fato praticado por inimputável.

No caso de moléstia superveniente (art. 152, CPP), a suspensão do processo justifica-se em atenção aos princípios da ampla defesa, a reclamar a sua efetiva particiação no feito.

Entretanto, a norma que estabelece a paralisação do processo até o completo restabelecimento do acusado deve ser interpretada em conformidade com o princípio da inocência, que veda a adoção de quaisquer medias que impliquem antecipação de culpa ou dos resultados finais do processo.

Assim, do mesmo modo que em relação ao acusado sadio não se poderá determinar a privação de sua liberdade a não ser com fundamentação em razões de natureza cautelar, também aqui não será possível o internamento do acusado, sem maiores considerações, tal como se encontra disposto no art. 152, § 1° do CPP.

É preciso ter sempre em conta que a privação da liberdade daquelesubmetido a processo penal ainda não sentenciado definitivamente, isto é, com decisão passada em julgado, será sempre uma custódia (recolhimento a estabelecimento prisional ou mesmo hospital, no caso de inimputável) do inocente, a exigir, portanto, ordem escrita e fundamentada da autorieade judiciária competente, conforme dispõe o art. 5°, LXI, da CF.

Tratando-se de inimputável, sujeito, então, à internação, como assinalado no mencionado § 1° do art. 152, a questão é ainda mais complexa, uma vez que não existe prazo certo para a privação da liberdade, tudo a depender da recupração mental do acusado.

Por isso, pela impossibilidade de se poder adotar qualquer tipo de critério hermenêutico que permita viabilizar a aplicação simultânea da referida norma de internação (por tempo indeterminado) e do princípio constitucional da inocência, precisamente em razão da indeterminação temporal, somos pela revogação do citado art. 152, § 1°, configurador de verdadeira antecipação dos resultados finais de uma ação penal condenatória.


*Eugêncio Pacelli de Oliveira, Curso de Processo Penal, Lumen&Juris, 9a. edição, 2008.