domingo, 13 de julho de 2008

SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS (5)

A doutrina identifica três sistemas distintos de processo, fazendo-o, principalmente e conforme a distribuição da titularidade das atividades de julgar, acusar e defender. São eles:

I – Sistema inquisitivo ou inquisitorial

É o processo em que se confundem as figuras do acusador e do julgador. Em verdade, não há acusador nem acusado, mas somente o juiz (o inquisidor), que investiga e julga, e o objeto de sua atividade (o inquirido). É considerado primitivo, já que o acusado é privado do contraditório, prejudicando-lhe o exercício da defesa.

II – Sistema acusatório

Caracteriza-se principalmente pela separação entre as funções da acusação e do julgamento. O procedimento, assim, costuma ser realizado em contraditório, permitindo-se o exercício de uma defesa ampla, já que a figura do julgador é imparcial, igualmente distante, em tese, de ambas as partes. As partes, em pé de igualdade (par conditio) têm garantido o direito à prova, cooperando, de modo efetivo, na busca da verdade real. A ação penal é de regra pública, e indispensável para a realização do processo. Costuma vigorar o princípio oral, imediato, concentrado e público de seus atos.

III – Sistema misto

Inaugurado com o Code d’Instruction Criminelle (Código de Processo Penal) francês, em 1808, constitui-se pela junção dos dois modelos anteriores, tornando-se, assim, eminentemente bifásico. Compõe-se de uma primeira fase, inquisitiva, de instrução ou investigação preliminar, sigilosa, escrita e não contraditória, e uma segunda fase, acusatória, informada pelos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

A Classificação do sistema processual brasileiro

Ressalvada nossa opinião quanto à divisão tradicional em “sistemas processuais”, de ver que a doutrina brasileira não é unânime quanto ao enquadramento do nosso processo penal em um dos sistemas mencionados. Para alguns autores (Hélio Tornaghi, p. ex.), a persecução penal é mista, já que se compõe de dois momentos ou fases:

a) Uma primeira fase, do inquérito policial, apresentar-se-ia essencialmente inquisitiva, sigilosa e não contraditória, figurando a pessoa do suspeito ou indiciado como mero objeto da investigação.
b) Uma segunda fase, após o encerramento do inquérito, com o oferecimento da denúncia ou queixa e com a instauração da relação processual, quando passariam a vigorar as garantias constitucionais das partes e, em especial, do acusado.

Outros autores, contudo, classificam o sistema brasileiro de acusatório (Mirabette, Tourinho, Scarance, etc.), já que a fase investigatória, inquisitiva, não é propriamente processual, pois que tem caráter administrativo. O processo, em si, desenvolve-se inteiramente em respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, assegurando-se a paridade de armas entre as partes, separando-se o órgão responsável pela acusação daquele que julga, ao final, a lide penal.

Nossa posição: Em que pese à divergência, fato é que a persecução penal no sistema brasileiro cinde-se em duas partes, configurando-se em sistema misto. A fase investigatória tem, em regra, caráter inquisitivo, a ela não se aplicando todas as garantias inerentes ao processo, porque não é um processo. Entretanto, é certo que, no âmbito específico do processo penal (subseqüente à fase investigatória), a função acusatória é organicamente separada da função decisória, de modo que, se a persecução penal como um todo pode ser classificada sob o gênero dos sistemas mistos, o processo penal em si – subseqüente à investigação – indubitavelmente é acusatório. Isto é, configura-se em verdadeiro processo penal (acusatório). Claras, portanto, a noção da parte (sistema inquisitório, na primeira; acusatório, na segunda) e do todo (sistema misto, na análise da persecução penal, da fase extrajudicial à judicial). A manutenção, aliás, de nosso sistema, preservando a existência do inquérito policial como uma “instrução provisória”, atende por outro lado à própria garantia do acusado de se ver protegido contra juízos errôneos e precipitados que poderiam se constituir caso se adotasse uma ação penal sem a prévia investigação, ou seja, aquela em que houvesse uma “unidade de instrução” (inexistência de inquérito, vigendo o contraditório desde o início), a pretexto de celeridade ou respeito ao contraditório.

(5) BONFIM, Edilson Mougenot, ob. cit. p. 28/31